O compasso, indiferente à volúpia que a ansiedade vem escrever nas ruas da cidade, percorre as agruras do inalterável. Chovem chafarizes de água monótona. Hoje a noite vestiu-se de chuva e, passiva, estendeu os carros sobre o pavimento molhado. São nove da noite. Ou talvez dez. A hora mudou e nós mudámos com ela. É sempre tarde. Nunca há ir e voltar quando se volta sempre. E a madrugada não permite insónias, só as que se permitem madrugar. Choveu mesmo muito, hoje. E as pessoas correm pelos passeios em cujas beiras se aglomeram lençóis de água e restos de lixo que já foi novo, por usar. Ninguém se apercebe, mas quiseram os homens que chovesse hoje. E a chuva caiu, serena, sem tocar ninguém (porque ninguém realmente a sente tocar-lhe). Hoje são chuvas de que amanhã não nos lembraremos. Hoje é Outono cerrado. Hoje é dia que vai morrer. Morram as lembranças vãs com ele. Role este pensamento pelas s ruas, junto com o lixo que já foi novo, por usar.
José Sócrates anunciou o aumento 1,25 % das pensões até 630 euros.
Como me debruço sobre um tema nunca antes falado
Anda por aí uma gripe. Não é daquelas que se faz “atchim” e, pronto, a mãe lá põe a mãozinha na testa, aflita, e “deixa-me medir-te a temperatura”, lá diz e assim se descobre como se pode ficar uns dias de cama, de termómetro debaixo do braço, para, no final, se recuperar com uma força renovada. Ora, a essa gripe recorrente, resolveram chamar-lhe, muito gentilmente, de gripe sazonal. Mas há uns tempos prá cá (não sei se têm ouvido), resolveu aparecer uma estirpe gripal diferente. Ela chegava, e as crianças, ao invés de fazerem atchim, e ficarem de cama com febre, também ficavam com vómitos, dores, enfim, um autêntico carrossel de sintomas. Então, como as televisões começaram a falar muito sobre essa tal,( como é que é mesmo)??Gripe A, as pessoas começaram a ficar assustadas e os panfletos para a prevenção disseminaram-se pelo país mais rápido do que a própria gripe (Ah!). Ora, que essa gripe mal vinda (como se atreveu?), diz que veio do México e foi num ápice que se propagou a toda a Europa. Cá em Portugal, houve uma linha, a que chamam, de forma muito eficiente e sagaz, 24 horas, a fim de encaminhar os “gripandos” (porque não se adopta este neologismo?) para o devido local, hospitais, farmácias, ou, na maior parte dos casos, para esse concelho tão sempre delicado,o chamado“repouso”. Mas não se pense que o Ministério da Saúde português ficou por aqui. Não. Sabão azul e desinfectante para as mãos foram também colocados nos WCs públicos e de empresas privadas (em casa não, em casa fica ao vosso critério, mas digo já que o Continente tem à disposição um gel desinfectante por um preço muito económico). Nas escolas, o cuidado foi redobrado, até porque as crianças são a vítima preferencial desta gripe A. Se antes a criança, quando se portava mal, tinha de se virar de costas para a parede (sempre fui contra este terrível e humilhante castigo), agora, o esquema é mais ou menos este: “Ai é, tens gripe A? Toca a ir para a sala de isolamento.” É traumatizante para uma criança, na minha modesta opinião. Ultimamente, anda por aí uma tal de Pandemrix (só o nome já dá vontade de espirrar). Para os mais acautelados, não se assustem. É só a vacina para liquidar essa malvada gripe A. Apesar de haver correntes a favor e contra, ontem ouvi o Marcelo Rebelo de Sousa dizer, com base na OMS, que os portugueses se deviam vacinar. E como em Portugal é Deus no Céu e Marcelo na Terra, vou confiar no seu (sempre) sábio concelho.
O primeiro-ministro italiano, Sílvio Berlusconi, diz que tenciona manter-se em funções, mesmo que seja condenado por corrupção, com o argumento de defender a democracia e o Estado de Direito.
As palavras deste “ilustre” senhor pecam porque, ridiculariza a função dos tribunais italianos ao afirmar que a condenação seria injusta. E se hipoteticamente for condenado, afirma-se como o salvador que pretende continuar em funções para lutar contra aqueles que injustamente o condenaram, ou seja, um tribunal imparcial, composto por um juiz ou juízes supostamente imparciais.
Tudo isto até poderia parecer normal mas, torna-se supeito que seis semanas após o regresso de Berlusconi ao poder tenha sido aprovada a lei Alfano, que visava dar imunidade ao chefe de Governo enquanto estivesse em funções.
A lei Alfano foi anulada pelo Tribunal Constitucional, alegando a violação do princípio da igualdade dos cidadãos perante a lei. Quando soube da decisão, Berlusconi tratou de acusar juízes, imprensa e o Presidente da República de parcialidade de esquerda.
Reflectindo sobre esta matéria, não será estranho que Sílvio Berlusconi que se diz inocente, ter tentado aprovar uma lei que lhe conferia imunidade enquanto desempenha-se as funções de primeiro-ministro. Uma lei que por sinal devia ser uma vergonha para qualquer chefe de estado, aproveitando-se da sua posição, para autoproclamar-se superior a todos os cidadãos, não estando abrangido pelas normas legais destinadas a todos. Será uma espécie de “santo”?
Felizmente a lei não foi aprovada e a revogação da lei Alfano, a 7 de Outubro, fez com os processos anteriormente suspensos fossem reabertos. É usual dizer que quem não deve não teme, e assim sendo, penso que é horrível um primeiro-ministro dizer que mesmo que seja condenado, não abdica do poder, em prol de um estado democrático, diga-se de passagem que ninguém é dono da verdade e um verdadeiro estado de direito aceita as decisões dos seus tribunais, como estrutura essencial desse mesmo Estado.