Julian Beever é um artista inglês que cria desenhos tridimensionais servindo-se do giz como material. Aplica a técnica de projecção intitulada de anamorfose, que cria uma ilusão 3D quando a imagem é visualizada a partir de determinado ângulo.
Julian Beever é um artista inglês que cria desenhos tridimensionais servindo-se do giz como material. Aplica a técnica de projecção intitulada de anamorfose, que cria uma ilusão 3D quando a imagem é visualizada a partir de determinado ângulo.
991 395 habitante numa só cidade. A pergunta que se insurge é, a título de exemplo, esta: mas que cidade detém tal quantificação populacional? Pertencente ao Estado Federal Alemão, Colónia arrebata a estatística. Mas não é só isso que Colónia arrebata: são passos despidos de discórdia, é gente pelo labirinto das ruas por visitar (tantas que se perdem umas às outras), é o dia tão curto para a conhecer, e, (ah, aflição!), ela mesma pronta a ser absorvida, e o tempo esgotando-se, assim, desprendido de nós. Esta é uma das coisas que sempre gostei de cidades como Colónia: lá as coisas são maiores do que as pessoas. Quando menos se está à espera, cai-se na vontade de atirar os panfletos informativos ao ar e ir, sem rumo certo, conhecer a história das coisas, contada por elas próprias. A catedral de Dom, simbolo da arte gótica, é exemplo perfeito desse fenómeno: a monumentalidade que nos cilindra constitui, por si só, um anestesiante sensorial.
Mas mais do que essa característica que a torna um alvo turístico por excelência ( perde-se o rosto aos turistas que entram e saiem, numa roda viva permanente), é a história que ela deixa em aberto, o motivo pelo qual nos recompomos e avançamos. Qual livro por desfolhar, as páginas que deixa suspensas estão no seu interior, este, igualmente magnânime. O tempo idoso que a Dom invoca deixa antever as inesgotáveis vezes que ela viu crescer a cidade. Viu ruas nascerem, lojas e cafés abrindo, mercados em alvoroço, pessoas de um lado para o outro, as mesmas lojas e cafés fechando, outras abrindo nos mesmos lugares. A cidade transformou-se e Dom sempre a acompanhou desde que, há pouco menos de mil anos, se viu edificada. Quando a segunda guerra mundial a interpelou, Dom, tal como a cidade, resistiu. O fogo entrou no seu interior e parte da catedral acabou destruída. A cor enegrecida de que se reveste é rasto desse encontro sinuoso entre a guerra e a cultura, história sem a qual Dom, inevitavelmente, não teria o mesmo encanto. Porque é esse misticismo da dor vencida, da mágoa de se ter visto despojada de forças, e, simultaneamente, do orgulho na cura da ferida, que nos faz abrir e fechar o queixo, uma e outra vez. Dias e dias correm à frente da catedral e ela a tudo resiste, austera, infalível às marcas do tempo. Astro em torno do qual toda a Colónia gravita, é símbolo da resistência alemã. Para além das suas portas, está a história que nunca se deixa calar. Quem a vê uma vez, nunca mais a esquece.
Fissura, de acordo com a 2ª edição (revista e actualizada!) do dicionário de Língua Portuguesa da Editora, tem como significado comum fenda. E é isso que nos propomos executar: fissurar o que nos chega por palavras, gestos, sons e impressões. Introspecção mecânica, avulsa; pegar nos factos e analisá-los à luz da nossa, sempre, admitamos, falível, perspectiva. Mas que não é mais do que o exprimir do pensamento numa sociedade que se diz pluralista, onde vemos a abulia a assomar como personagem principal no quotidiano de uma democracia em crise. Em crise ideológica, acima de tudo. Definirmo-nos enquanto seres individuais e pertencentes a uma comunidade passa por dar voz à nossa opinião, na verdadeira ascensão da palavra. Liberdade de expressão, é um dos direitos fundamentais do Homem, consagrados na Declaração Universal dos Direitos do Homem. Vem entroncar no 10º lugar, pasme-se. Mas há sempre lugar para ela, por cá. Valorizá-la, é esse o nosso ponto de partida.